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terça-feira, 7 de março de 2017

AUTISMO - BREVE ESTUDO



1. Quadro clínico da síndrome: Início precoce 
A maioria dos pesquisadores e clínicos concorda que os sintomas do autismo infantil, geralmente, iniciam-se antes dos trinta meses de idade. Indicadores que o processo de desenvolvimento da criança não vai bem podem ocorrer antes dos seis meses de idade. Crianças que choram demais ou são vistas como muito quietas pelos pais, crianças que têm pouco contato visual, não mantêm posição antecipatória ou não prestam atenção aos eventos familiares principais podem estar apresentando sintomas iniciais da síndrome autista. As alterações no ritmo do desenvolvimento da criança também costumam ocorrer precocemente. 
O início precoce é um dos principais sintomas que diferenciam o autismo infantil do transtorno desintegrativo na infância. Na síndrome de Heller, o quadro clínico se inicia após um período de desenvolvimento normal da criança e, geralmente, ocorre após os três primeiros anos de vida. 
O DSM não inclui o início precoce como critério diagnóstico, visto que há relatos de síndromes autistas típicas que se iniciam em pessoas entre 4 e 31 anos de idade, em conexão, por exemplo, com uma encefalite herpética (DELONG, BEAU, BROWN, 1981).

Interação social recíproca
Os distúrbios na interação social dos autistas podem ser observados desde o início da vida. Com autistas típicos, o contato ‘olho a olho’ já se apresenta anormal antes do final do primeiro ano de vida (MIRENDA, DONNELLAN, YODER, 1983). Muitas crianças olham de canto de olho ou muito brevemente. Um grande número de crianças não demonstra postura antecipatória ao serem pegos pelos seus pais, podendo resistir ao toque ou ao abraço. Dificuldades em se moldar ao corpo dos pais, quando no colo, são observadas precocemente. Crianças que, posteriormente, receberam o diagnóstico de autismo, demonstravam falta de iniciativa, de curiosidade ou comportamento exploratório, quando bebês.
Frequentemente, seus pais as descrevem como: "felizes quando deixadas sozinhas", "como se estivessem dentro de uma concha", "sempre em seu próprio mundo”. Os autistas têm um estilo ‘instrumental’ de se relacionar, utilizando-se dos pais para conseguirem o que desejam. Um exemplo de modo instrumental de relacionamento ocorre quando a criança autista pega a mão de sua mãe e a utiliza para abrir uma porta em vez de abrir a porta com sua própria mão.

FRITH (1991) sugere que a falha básica nos autistas é a incapacidade de atribuir aos outros indivíduos sentimentos e pontos de vista diferentes do seu próprio, concluindo que falta a essas crianças uma "teoria da mente". Esse fato faz com que a empatia da criança seja falha, afetando sentimentos básicos, como medo, raiva ou alegria. As pessoas, os animais e os objetos acabam sendo tratados de um mesmo modo, visto que a criança não percebe a diferença entre um indivíduo que pensa e tem desejos e um objeto inanimado.
 
As crianças autistas não compreendem como se estabelecem as relações de amizade. Algumas não tem amigos e outras acreditam que todas as crianças de sua sala de aula são seus amigos.
A indiferença em dividir atividades e interesses com outras pessoas também é um sintoma marcante (a habilidade em mostrar objetos de interesse para outras pessoas ocorre no primeiro ano de vida, e a ausência desse sinal é um dos sintomas mais precoces do autismo infantil).
Os autistas apresentam dificuldades em manter um contato social inicial, demonstrando problemas para sustentar esse contato, com frequência interrompido prematuramente.

Com o passar dos anos, as anormalidades de relacionamento social tornam-se menos evidentes, principalmente se a criança é vista próxima de seus familiares. A resistência em ser tocado ou abraçado bem como o evitamento no contato visual tendem também a diminuir.

Linguagem e comunicação
Quando os autistas começam a se utilizar da linguagem (ou falham em começar), os pais passam a perceber com mais clareza que seus filhos são diferentes das outras crianças da mesma idade. Muitas vezes, é o atraso na aquisição de linguagem verbal que faz com que os pais procurem ajuda médica.
Apesar desse fato, sinais de dificuldades na capacidade de comunicação das crianças autistas são evidentes mesmo antes do período de aquisição da linguagem verbal, mas passam desapercebidos pelos pais. Nas crianças autistas, a comunicação não verbal precoce é usualmente limitada ou inexistente. Bebês rapidamente desenvolvem uma habilidade de se comunicar por meio de sinais não verbais: demonstram suas emoções pela expressão facial, procuram por objetos de interesse ou por pessoas, antecipam-se para obter contato físico com seus pais. O mesmo não ocorre com crianças autistas.
Usualmente, crianças autistas demonstram sérios problemas na compreensão e utilização da mímica, gestualidade e fala. 
Desde o início, os jogos de ‘faz de conta’ e de imitação social, amplamente observados nas crianças com desenvolvimento normal, são falhos ou inexistentes.
Quase sem exceção, os autistas apresentam atraso ou ausência total no desenvolvimento da linguagem verbal, que não é compensado pelo uso da gestualidade ou outras formas de comunicação. Apesar de não demonstrarem alterações significativas no balbucio (DAHLGREN & GILBERG, 1989), metade dessas crianças não adquirem linguagem verbal e, as que adquirem, apresentam sérios desvios de linguagem. Aproximadamente 37% das crianças autistas começam a falar as primeiras palavras normalmente, mas param de falar, repentinamente, entre o vigésimo quarto e o trigésimo mês.
Os autistas que desenvolveram linguagem apresentam dificuldades marcantes em iniciar ou sustentar diálogos e, muitas vezes, apesar de se utilizarem da fala, não visam comunicação.
Nas crianças que falam, o uso restrito e estereotipado da linguagem é bem descrito. Por exemplo, KANNER (1943) descreveu uma menina autista que seguia uma rígida rotina antes de ir dormir, exigindo que sua mãe participasse de um diálogo que era idêntico dia após dia. Outros aspectos da linguagem restrita e estereotipada são a ecolalia imediata ou tardia, a inversão pronominal, a linguagem metafórica e a invariabilidade do ritmo e tonalidade da linguagem verbal.

Repertório restrito de atividades e interesses 
Completando a tríade diagnóstica, um repertório restrito e pouco criativo de interesses e atividades ocorre com as crianças autistas.
Os interesses da criança autista costumam ser anormais, principalmente, em seu foco e intensidade. Por exemplo, indivíduos autistas podem aprender uma vasta quantidade de informações sobre um determinado assunto, tal como carros ou novelas, memorizando uma gama de informações e conversando de forma insistente e estereotipada sobre o assunto por eles escolhido. Em sua atividade lúdica, costumam focar seu interesse em apenas um determinado brinquedo ou determinada maneira de brincar (ex.: ficam enfileirando os carrinhos durante horas)
Os indivíduos autistas apresentam uma insistência na ‘mesmice’, que se apresenta pelo seu comportamento inflexível e suas rotinas e rituais não funcionais, por exemplo, costumam seguir sempre determinados caminhos até a escola, têm rituais para dormir ou se alimentar. Mudanças no ambiente que a criança costuma frequentar podem causar episódios de agitação psicomotora e agressividade. Mudanças mínimas no ambiente costumam causar quadros mais severos de agitação do que mudanças maiores. Por exemplo, uma menino autista de 5 anos chorou durante quase uma hora até sua mãe perceber que havia retirado um livro de sua estante; ao ter o livro reposto, parou de chorar em segundos.
As rotinas e rituais costumam se agravar na adolescência, chegando até a caracterizar um diagnóstico de transtorno obsessivo-compulsivo. 
Frequentemente, crianças autistas vinculam-se de forma bizarra a determinados objetos ou partes de objetos, tais como pedras, fios, a roda de um carrinho. Adoram objetos que brilham ou que giram (por exemplo, tampas de panelas). Os objetos, usualmente selecionados a partir de uma característica particular (cor, textura), permanecem com a criança durante horas ou dias, e sempre que alguém tenta removê-los, a criança torna-se inquieta ou agressiva, resistindo à mudança. 
Movimentos corporais estereotipados são comuns e apresentam-se sob a forma de "flapping", balanceio da cabeça, movimentos com os dedos, saltos e rodopios. Esses movimentos costumam ocorrer, principalmente, entre os mais jovens e os que têm um funcionamento global mais baixo. Apesar de também estar presentes nas crianças que apresentam apenas retardo mental, nos autistas os movimentos costumam ser mais elaborados e intensos.

Comportamentos inespecíficos associados ao autismo
Apesar de comumente associadas à síndrome, várias características clínicas não são incluídas nos critérios diagnósticos. Crianças com autismo mostram, em geral, um padrão cognitivo desigual e, frequentemente, têm uma melhor performance nas tarefas não verbais e visuoespaciais do que nas tarefas verbais. Sintomas comportamentais associados à síndrome incluem hiperatividade, curto tempo de atenção, impulsividade, comportamento agressivo, acessos de auto agressividade e agitação psicomotora. Algumas pessoas com autismo têm respostas extremas aos estímulos sensoriais, tais como hipersensibilidade a luz, som, toque, e fascinação por certos estímulos auditivos ou visuais. Distúrbios do sono e da alimentação também são comuns nessas pessoas, além de medo excessivo em situações corriqueiras ou perda do medo em situações de risco.
Esses sintomas inespecíficos, apesar de não fazerem parte dos critérios diagnósticos primários, são os que mais trazem problemas para a família e a equipe terapêutica, fazendo com que as crianças, muitas vezes, tenham que ser medicadas com psicotrópicos, para um melhor controle desses comportamentos.

2. Resumo da Discussão dos Resultados
A concordância entre os diversos avaliadores para o aspecto ISR (interação social recíproca), no grupo e no geral, foi verificada por meio do cálculo do coeficiente de Kappa. Constatou-se que houve maior concordância entre todos os avaliadores, para os autistas, nos itens ISR02, ISR03, ISR06 e ISR08. Apesar de as médias indicarem uma baixa concordância entre os avaliadores, ao observarmos a concordância entre cada par de avaliador notamos que nas questões ISR02, ISR03, ISR06, ISR08 há índices que indicam concordância de média a alta entre pelo menos três pares de avaliadores. Ocorreu maior concordância entre as respostas dos profissionais do que entre as respostas dos pais. Os profissionais parecem concordar mais do que os pais quanto à interação social recíproca (os índices obtidos pelas questões ISR03, ISR06 E ISR09 indicam uma alta concordância entre os profissionais).
As questões que apresentam maiores índices de concordância referem-se às falhas das crianças autistas na percepção de pessoas e acontecimentos ao redor, na procura por contato e interação social e no reconhecimento de controles sociais, reforçando que os déficits de empatia são fundamentais para o diagnóstico da síndrome autista. FRITH (1991) sugeriu que a falha básica no autismo infantil é a falta de desenvolvimento precoce de uma "teoria da mente", levando a criança a não conceber que outras pessoas pensam e têm sentimentos. O não desenvolvimento de uma teoria da mente levará a um inevitável déficit de empatia. Tal déficit, contudo, não afeta a habilidade da criança de observar o mundo e manter sua razão lógica.
Ainda que os sentimentos, tais como medo, raiva, alegria, estejam necessariamente afetados em crianças que apresentam déficits de empatia, ocorreu uma baixa concordância na questão ISR01, que se refere à capacidade da criança de manifestar seus sentimentos e afetos, demonstrando que os aspectos afetivos não são mais sintomas confiáveis para a realização do diagnóstico. Esse fato reforça teorias que consideram o autismo, principalmente, decorrente de comprometimentos na senso-percepção e não decorrente de comprometimentos da instância afetiva, como inicialmente acreditava Kanner.
Decidiu-se pela manutenção da questão que se refere ao contato visual, pois, além de ter havido concordância total entre os profissionais, esse sintoma é um dos primeiros a ser observados antes do final do primeiro ano de vida da criança autista e, juntamente com mímica, gestualidade e expressão corporal, é um dos principais reguladores da interação social.
No aspecto comportamento estereotipado e restrito (CER), verificou-se um índice maior de concordância entre todos os avaliadores, para os autistas, nos itens CER02, CER03, CER06, CER08 e CER09. Essas questões obtiveram taxas que indicam de média a alta concordância entre todos os pares de avaliadores, sendo que as questões CER06 e CER09 também obtiveram boa concordância na média dos avaliadores. Essas questões referem-se à capacidade criativa das crianças avaliadas, um sintoma necessário ao diagnóstico e com altas taxas de concordância, quando presentes. Importante ressaltar que essas taxas que indicam de média a alta concordância só apareceram no grupo das crianças autistas, não havendo concordância entre os avaliadores das crianças surdas ou com déficit intelectual sem autismo.
As questões que se referem às preocupações fora do contexto (CER03), intimamente relacionadas com ideias obsessivas, e à presença de comportamento compulsivo, na forma de rituais, também apresentam boas taxas de concordância entre os pares de avaliadores. A manutenção de rituais e comportamentos motores mais complexos obtiveram taxas de concordância maiores do que a estereotipia motora ou posições rebuscadas. Esses comportamentos ritualísticos costumam estar acompanhados de aumento da atividade motora, estreitamento do campo de consciência, atenção focada unicamente no ritual, diminuição da vigilância. Quando forçados a abandonar as práticas ritualísticas, pode-se observar um quadro de irritabilidade, agressividade e agitação psicomotora.
Quando as questões se referiram à mímica e gestualidade da criança, os coeficientes não indicaram uma concordância satisfatória. As questões LEC09 e LEC10 foram mantidas, apesar de encontrada uma baixa concordância, devido a sua importância para o estudo das práticas não verbais com crianças autistas e por serem, juntamente com o contato visual, importantes reguladores da interação social e fundamentais na diferenciação de crianças com distúrbios da linguagem expressiva.
Associado ao quociente de inteligência, a aquisição de linguagem verbal tem demonstrado ser um importante elemento do prognóstico. Por essa razão, criou-se uma nova opção de resposta (SR= sem resposta) no aspecto LER, pois tem se verificado que as crianças que não apresentam linguagem verbal têm um prognóstico pior do que as que aprendem a falar até cinco anos de idade, embora a fala, muitas vezes, não objetive comunicação. Esse artifício permite que se perca o importante dado que é a criança não falar. Sua pontuação é maior por sua importância no prognóstico das crianças. Nesse aspecto, os dados encontrados não são específicos da criança autista, sendo encontrada alta incidência de crianças que não falam entre a população de surdos e com retardo mental.
Embora os itens do aspecto comportamentos inespecíficos (CIN) não sejam essenciais para o diagnóstico da síndrome, algumas perguntas do questionário-piloto foram mantidas, no questionário final (CIN01 a CIN06), por se referirem a sintomas comportamentais frequentes e com importantes repercussões na dinâmica familiar e rotina de trabalho com as crianças. Esses sintomas são aqueles associados a uma excessiva atividade motora com déficit de concentração, auto e heteroagressividade e comportamentos fóbicos. Foram também esses itens que obtiveram taxas que indicam de média a alta concordância entre os pares de avaliadores. As questões associadas aos distúrbios da sensibilidade e compulsão por alimentos não obtiveram bons índices de concordância. Os itens que indicaram altas taxas de concordância entre os autistas não obtiveram o mesmo êxito com as crianças surdas ou com retardo mental puro
A mãe demonstra concordar mais com os profissionais que atendem a criança, contrastando com o pai, que costuma discordar mais dos profissionais quanto à interação social e comportamentos restritos e estereotipados. Creio que esse fato se deva à presença mais constante das mães, como acompanhantes dos filhos autistas nas diversas instituições ou serviços, ampliando seu contato com os profissionais. As mães da amostra passam a maior parte do tempo dentro da escola e, enquanto aguardam seus filhos serem atendidos, acabam tendo uma troca mais intensa de informações com os profissionais, seja informalmente ou em trabalhos estruturados de orientação familiar. A não aceitação do diagnóstico de seus filhos, a negação do problema ou sentimentos ambivalentes em relação à criança e, consequentemente, menor contato afetivo, tanto com o filho quanto com a esposa, fazem que os pais costumem ser mais ‘ausentes’ nos cuidados com as crianças e tenham uma visão distorcida dos comportamentos apresentados pelos seus filhos. As famílias em que os cônjuges mantêm um relacionamento afetivo estável, além de participarem do tratamento da criança, costumam apresentar níveis menores de estresse familiar.
No aspecto comportamentos estereotipados e restritos, houve uma diferença significativa entre os grupos para os escores de todos os avaliadores, inclusive o avaliador A3. As médias e medianas dos escores dos avaliadores do grupo de crianças autistas tendem a ser maiores do que as dos escores dos avaliadores dos grupos de crianças com retardo mental e crianças surdas. Quando comparamos os escores das crianças autistas e das surdas, verifica-se uma diferença significativa ( p<0,05) entre os escores de todos os avaliadores. O mesmo ocorre quando comparamos os escores das crianças com retardo mental e das surdas, havendo diferença significativa entre os grupos para todos os avaliadores.
Ainda nesse aspecto, o questionário-piloto demonstrou um poder discriminativo entre os grupos de crianças autistas ou com retardo mental e o grupo de surdas. As médias dos escores das crianças surdas foram abaixo de zero para três avaliadores, demonstrando uma ausência de sintomas ligados a estereotipias motoras, rituais e à capacidade criativa nesse grupo.
Ao se compararem os escores das crianças autistas e das crianças com retardo mental, verificou-se uma diferença significativa entre os dois grupos para dois avaliadores (A1 e A4), demonstrando que esse aspecto é fundamental para um diagnóstico diferencial entre os grupos citados, já que, como veremos adiante, no aspecto linguagem e comunicação, a exemplo do aspecto interação social recíproca, também não houve diferença significativa entre os dois grupos. A presença, nos autistas, de interesses sensoriais e preocupações estranhas, apego idiossincrático aos objetos e rituais, quando somados à ausência da capacidade criativa, são sinais importantes para o diagnóstico diferencial de autismo infantil e retardo mental.

REFERÊNCIA: 
Moraes C - Autismo Infantil, in. PsiqWeb, Internet, disponível em http://www.psiqweb.med.br/, 2004. (Acesso em 07/3/2017 – 15:40 h).


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